domingo, 28 de dezembro de 2008

A ESPERANÇA NUM MUNDO MELHOR

Num mundo tão perturbado e tendo consciência que me ultrapassam muitas das cruéis realidades que afligem a humanidade, o futuro deixa-me muito inquieta. É sempre muito difícil conseguirmos avaliar as situações quando não as vivemos, mas por tudo o que nos é transmitido pelos órgãos de comunicação, nós sabemos que os tempos que atravessamos não são os melhores e irão deixar marcas bem profundas na História da humanidade. Apesar de todo o mal-estar que se vai avolumando com todas as notícias que nos chegam e que não excluem o nosso país, há sempre a esperança que os acontecimentos que se prevêem tenham um desfecho diferente daquele que se imagina. E se cada um de nós contribuir para amenizar as tensões que se criam no pequeno mundo onde nos movemos? Se o fizermos já estamos a ajudar na construção duma sociedade melhor. Procurando viver em paz com aqueles que nos rodeiam, lutando contra as injustiças que teimam em oprimir os mais fracos, manifestando a nossa solidariedade com os desprotegidos, numa palavra, amando o nosso próximo como a nós mesmos. Como este mundo poderia ser diferente se cada homem olhasse o outro como seu irmão e Deus como seu Senhor!
Oxalá, ao contrário do que a actual situação nos deixa antever, o ano de 2009 nos surpreenda com um melhor relacionamento entre as nações, o baixar das armas, o empenhamento profundo de todos aqueles que têm o poder nas suas mãos, para que todo o ser humano possa viver com a dignidade a que tem direito, o cuidado colectivo na preservação do nosso planeta. Que todos possam dar as mãos e trabalhar para que neste mundo nos possamos sentir felizes!

quarta-feira, 10 de dezembro de 2008

A SOLIDÃO

Ouvi de alguém estas palavras “As pessoas sentem-se solitárias porque constroem paredes em vez de túneis”. Mesmo quando não se quer admitir que nos sentimos sós, deixamos sempre escapar um ou outro desabafo que alguém mais atento compreenderá que afinal não nos é assim tão fácil conviver com a solidão. Posso referir, particularmente, aqueles que vivem sozinhos , independentemente da sua classe social, por opção ou imprevistos da vida, como um divórcio, a morte de familiares ou, por exemplo, os filhos que deixam a casa para seguirem as suas carreiras profissionais ou constituírem família. Entre estas pessoas estão também os mais idosos, que para combater a solidão recorrem aos centros de dia, regressando só ao final da tarde, ou aqueles que, por decisão própria, vão para os lares da terceira idade para se sentirem mais acompanhados. Que dizer, então, de crianças, adolescentes e jovens, que se sentem sós, embora tenham a companhia dos seus colegas de estudo e em casa uma família que os apoia? E os mais velhos, com família constituída e uma vida activa? Será que não há momentos em que se sentem solitários? Porque podemos ter um mundo de pessoas à nossa volta e no entanto sentirmo-nos sós! Penso que muitos de nós já vivemos essa experiência, conseguindo até passar a imagem de sermos pessoas fortes, sempre de bem com a vida e até com pouco tempo disponível, para termos alguns momentos só nós! Seja qual for a nossa idade, ou pela nossa dificuldade em comunicar com os outros ou pela pouca disponibilidade de tempo para conviver, a verdade é que muitas vezes nos sentimos sós.
Lembro-me de uma amiga que, com muita dificuldade e até má vontade, aceita a visita dos que lhe querem amenizar a solidão. São situações difíceis, porque estas pessoas , a pouco e pouco foram-se isolando, perdendo hábitos sociais e não só, e as visitas deixam de ser bem vindas. São as tais paredes que se vão construindo e que se transformam em barreiras difíceis de derrubar. Mas, um telefonema que se atende, a porta que se abre a um amigo e um passeio numa tarde soalheira, são pequenas brechas que se vão abrindo e que podem levar aos tais túneis, que irão conduzir ao mundo do qual se foi fugindo, por vontade própria ou pelas circunstâncias que a vida impôs. No pouco tempo que estou com a minha amiga, aconselho-a a sair de casa para passear, conviver com outras pessoas e não estar sempre sozinha, como acontece já há vários anos. E ela responde-me com estas palavras: “ Eu não estou sozinha, o Senhor está sempre comigo, Ele não me desamparará.”
No Salmo 23 encontramos estas palavras reconfortantes e das quais tantas vezes nos esquecemos : “O Senhor é o meu pastor : Nada me faltará. Deitar-me faz em verdes pastos, guia-me mansamente a águas tranquilas. Refrigera a minha alma; guia-me pelas veredas da justiça, por amor do seu nome. Ainda que eu andasse pelo vale da sombra da morte, não temeria mal algum, porque tu estás comigo; a tua vara e o teu cajado me consolam. Preparas uma mesa perante mim na presença dos meus inimigos, unges a minha cabeça com óleo, o meu cálice transborda. Certamente que a bondade e a misericórdia me seguirão todos os dias da minha vida : e habitarei na casa do Senhor por longos dias”.








sexta-feira, 28 de novembro de 2008

UMA VIAGEM DE COMBOIO

Numa das Revistas TABU do mês de Novembro, Vítor Rainho escreveu que “O conceito de viagem tem vindo a mudar com as alterações das políticas das companhias aéreas. Há uns anos, andar de avião era algo que as classes mais desfavorecidas, regra geral, só conseguiam visualizar em sonhos. Mesmo longas distâncias eram percorridas de comboio ou autocarro.”
Lembrei-me da primeira viagem que fiz de comboio, sozinha, para além fronteiras. Fui convidada para participar num campo internacional de trabalho numa pequena localidade da Alemanha, Nordkichen, na região da Westfália. Era jovem. Posso considerar que, naquele tempo, foi uma aventura e ainda hoje me admiro da minha coragem, até porque pouco tinha viajado dentro do nosso país. Apesar das supostas dificuldades que poderia encontrar, no dia 4 de Agosto, as 8.40 horas, parti rumo ao desconhecido, sem receios, disposta a aproveitar todas as experiências que iria viver a dois mil e tal quilómetros de casa.
Naquela viagem registei no meu diário: “ Entrámos em Espanha às 5 horas da tarde. Fiquei desiludida com este país, nosso vizinho. Desde o aspecto descuidado dos homens das estações, com as suas fardas dum verde desbotado, grandes demais, às casas cor de terra, os terrenos incultos, tudo com um ar de abandono. Não me podia mexer para não incomodar o meu companheiro do lado que dormia. Passámos a noite a atravessar a Espanha, no comboio que parecia não andar a mais de 10 km à hora. Quando se fez dia, vi uma Espanha diferente. A paisagem era linda, muito verde, e já podíamos ver os Pirinéus, com a sua beleza imponente, parecendo que a qualquer momento se poderiam despenhar sobre o pequeno comboio que nos levava. Passámos muitos túneis. Tomei o pequeno almoço no comboio. Que grande desilusão!... Serviram-me um café que, talvez, nem um quilo de açúcar o conseguisse adoçar, e um “croissant” pouco saboroso. Paguei 22,5 pesetas, ou sejam, 13.50 escudos. Chegámos a Hendaye às 11.30 horas. Depois de muitas voltas, sempre com as malas na mão, fomos à alfândega , mas a mim não me abriram as malas, felizmente! Ás 2,43 horas da tarde tomei outro comboio directo para Paris, moderno e confortável. Achei a França muito bonita com a sua vegetação luxuriante e salpicada aqui e além com as tendas dos campistas. Chegámos a Paris ás 23,30 horas. Passei a noite num hotel. No dia seguinte passeei pelos “boulevards” daquela linda cidade, sempre de mapa na mão para não me perder. Parti às 11,00 horas da noite da Gare do Norte rumo à Alemanha. Cheguei a Dortmund às 11,00 da manhã e apanhei outro comboio que me deixou em Nordkichen, onde me esperava o dirigente do campo de trabalho. A minha viagem terminou perto do meio-dia no dia 7 de Agosto. Até que enfim!”
Voltei a fazer outras viagens de comboio que deixavam sempre histórias para contar. Muitos anos depois, fiz duas viagens de autocarro, uma para a Suiça e outra para a Alemanha, que não me deixaram vontade de repetir a proeza.
Aquela longa primeira viagem para a Alemanha, que demorou 46 horas de comboio, fora as mudanças que tive de fazer e o tempo que esperei nas estações e em Paris, resumem-se hoje acerca de 3 horas de avião.
Agora, viajar nos comboios de alta velocidade, as grandes distâncias fazem-se em poucas horas. O conforto que oferecem aos passageiros tornam as viagens muito agradáveis. Sentimo-nos mais à vontade, podemo-nos levantar e esticar as pernas, ir até ao bar, enfim, um conjunto de mordomias que nos são proporcionadas. Mas viajar de avião, além do tempo que poupamos e embora não nos sintamos muito confortáveis, também tem os seus encantos. Há dois anos, num voo nocturno, apreciei o nascer do sol. Não tenho palavras para descrever o que senti, foi maravilhoso !!
E Vitor Rainho termina com estas palavras: “Como todos os fenómenos de moda à medida que se vão alastrando vão morrendo na origem, viajar de avião, hoje, não tem qualquer carga glamorosa, nem tão pouco representa estatuto. Os lugares são mais apertados, o serviço é quase inexistente e, como tal, fantástico é andar de avião particular.”
Isso agora já se torna mais difícil…Vamo-nos contentando com uma viagem comprada na ”net” que a vida não está para grandes aventuras.

segunda-feira, 24 de novembro de 2008

quarta-feira, 19 de novembro de 2008

domingo, 16 de novembro de 2008

O QUE FARIA ...

Gosto muito de ver os programas da Oprah, na SIC Mulher. Alguns para nós não têm muito interesse, pois são mais dirigidos ao público americano, mas outros apontam casos, falam de assuntos que pela sua natureza e pelas experiências vividas por aqueles que são convidados para o programa, são realidades também da nossa sociedade. Considero a Oprah uma boa apresentadora, que vai ao âmago dos problemas, muito directa nas suas considerações, impelindo aqueles que entrevista a respostas bem concretas e decisivas.
Há uns dias atrás, o programa tinha o tema “O que faria…” Não o vi desde o início, mas o que estava em causa era o que faríamos, qual seriam as nossas reacções, se estivéssemos perante determinadas circunstâncias. Era um programa semelhante aos “Apanhados”, que todos nós conhecemos da nossa televisão. Havia actores que criavam cenas na rua, que pediam a interferência de alguém para ajudar a resolver as situações. Por exemplo: Um homem enfurecido, ofendia oralmente a mulher, ambos pessoas de cor. A maior parte das pessoas olhava, mas continuava o seu caminho, indiferente ao que via. Um homem, muito aborrecido, gritou-lhes que fossem para casa discutir, mas que não estivessem ali a incomodar quem passava. Até que, uma mulher já idosa, aproximou-se da vítima e, carinhosamente, levou-a consigo. Um outro caso, mostrava uma mãe, ainda jovem com duas crianças, seus filhos, alcoolizada e que, em grande aparato, procurava as chaves do carro que não conseguia encontrar. Depois, já com elas na mão, sempre aos tombos, mandava os filhos entrar para o carro e preparava-se para conduzir. Houve uma certa contestação por parte de quem se tinha juntado, até que um homem já idoso, tira-lhe as chaves da mão, impedindo-a de conduzir num tal estado de embriaguez. Um terceiro caso, passa-se numa padaria, onde uma mulher islâmica, que queria comprar pão, é injuriada pelo empregado que se recusa a atendê-la. A fila dos que aguardam pela sua vez vai crescendo assim como o mal-estar que se apodera das pessoas pelo tempo que estão a perder. Mas há duas jovens, de 15 e 16 anos, que, perante tal situação, reagem à atitude do empregado, manifestando a sua discordância e revolta. O dono da loja foi chamado por elas e resolveu a situação, vendendo o pão que a mulher desejava.
Estes três exemplos mostram-nos que vivemos numa sociedade onde, muitas vezes, impera a indiferença. Vivemos os dias numa correria constante, preocupados e ansiosos, sem prestarmos atenção àqueles com quem nos cruzamos, que vivem perto de nós e, em alguns casos, até são nossos familiares. Penso que, talvez, não se trata tanto de indiferença, de insensibilidade, mas antes do peso que transportamos sobre nós com todas as pressões que a vida nos impõe. Nas grandes cidades, por exemplo, se estivermos atentos, veremos, especialmente em horas de ponta, as pessoas caminhando apressadas, de olhos no chão, receosas de perder os transportes, pensando nas tarefas que ainda as esperam em casa, o desejo de chegar ao aconchego do seu lar…O pensamento está longe. Mas há também em nós uma certa cobardia e comodismo, o receio de nos envolvermos nos problemas dos outros, de, perante certas situações, temermos que alguma coisa corra mal. Muitas vezes, olhamos de soslaio e continuamos o nosso caminho. Mas, graças a Deus, ainda há aqueles que se esforçam por intervir em situações que mexem com a sua sensibilidade e os seus valores. Cada vez mais nós assistimos a casos de injustiça, de desumanidade, de falta de amor, que nos perturbam e que nos deixam muito tristes. Nós precisamos de ser solidários, não permitirmos que a indiferença controle os nossos sentimentos e nos impeça de olhar os outros como irmãos.
Relembro uma frase que ouvi no final do programa da Oprah; “Não é o ódio que mata as pessoas, mas sim a indiferença”.

sábado, 25 de outubro de 2008

TRABALHAR EM EQUIPA

Sou fã do programa da SIC Mulher, “Querido mudei a casa”. Um dia, encho-me de coragem e candidato-me também. Mas a distância conta muito, os pedidos, calculo, são imensos e as escolhas devem obedecer a determinadas regras e, com tudo isto, as minhas possibilidades são mínimas ou praticamente nulas…
Há poucas semanas atrás, o “Querido” foi renovar uma cozinha na zona de Lisboa. A família era constituída pelos pais e dois filhos adolescentes. A mãe cozinhava para fora. Foram os filhos, com a ajuda do pai, que escreveram a candidatarem-se para a transformação da cozinha, que não reunia, como pudemos ver, as condições necessárias e desejáveis. Depois de dois dias e muitas horas durante a noite de um trabalho incessante, foi com muita alegria e emoção que a família foi surpreendida com uma nova cozinha, muito bem equipada, funcional e bem decorada, ultrapassando todas as expectativas da família. E era a própria mãe que dizia, chorando, que era muito difícil para os espectadores poderem avaliar aquela cozinha, que estava muito linda! Confesso que, quando o programa terminou, eu fui dar uma olhadela à minha cozinha, suspirando pela visita do “Querido”!
Quando vejo este programa, admiro a maneira como aquela equipa trabalha, desde a apresentadora, passando pelos decoradores e restantes trabalhadores, incluindo também os técnicos da televisão.
Posso ver, pelo menos é essa a minha impressão, a camaradagem e o espírito de equipa que ali existe. A preocupação de todos é dar tudo por tudo para que o projecto, que têm para aquele espaço, seja conseguido e realizado dentro do prazo estipulado. Os decoradores, por vezes, têm de fazer alterações ao projecto que tinham criado, porque aqueles que com eles trabalham se deparam com situações inesperadas, difíceis de ultrapassar em apenas dois dias, e são eles próprios que sugerem alternativas. Cada um tem de cumprir a sua tarefa, é por ela que é responsabilizado, mas quando o trabalho aperta, todos partilham do sentimento de reunir esforços e ajudar no que for preciso para concluir o projecto, surpreender os concorrentes e o programa possa ser transmitido. Infelizmente, nem sempre isso se passa no mundo do trabalho. Há muito a ideia de cada um fazer somente o trabalho que lhe compete. É normal o trabalhador ocupar um determinado lugar segundo as suas capacidades e qualificações. E por ocuparem esses cargos são responsabilizados e remunerados. É esperado que saibam trabalhar em equipa para que daí resulte um bom ambiente de trabalho e a empresa ou instituição atinja os seus objectivos. Porém, trabalhar em equipa exige capacidade de partilha nas mais variadas situações. Se o meu colega tem muito trabalho e eu tenho disponibilidade, eu devo tentar dar uma ajuda. Surge uma situação inesperada e a pessoa responsável não está no momento, se posso, procuro resolver o problema e muitos outros casos poderiam ser apontados. Criar barreiras, mostrar atitudes de indiferença, não valorizam as pessoas e só prejudicam as relações e reflectem-se na boa imagem que devemos dar como profissionais. Criam instabilidade e acabam por ter repercussões na prestação dos bons serviços que as entidades empregadoras se empenharam para poderem ter sucesso. No final, acabam por nem uns nem outros saírem beneficiados.

domingo, 19 de outubro de 2008

GRATIDÃO

Quando passo pela zona da nossa cidade conhecida pelo Pinhal, olho sempre para uma casa pequena, amarela, que fica numa esquina e hoje desabitada e degradada. Recordo então, que há muitos anos, era habitada por uma mulher, mãe solteira, com dois filhos pequenos. Trabalhava a dias e levava uma vida muito dura. Quando a conheci, tinha os filhos num infantário, e, segundo me contavam, havia meses que ela não podia pagar as mensalidades dentro do prazo estipulado, embora fosse uma pequena importância. Quando sabia que isso ía suceder, telefonava, pedia muitas desculpas pelo atraso e prometia fazê-lo logo que lhe fosse possível e cumpria sempre! Era uma mulher que lutava arduamente para poder dar aos filhos o mínimo de condições. Qualquer atenção que recebia, qualquer favor que lhe prestassem, ela mostrava-se sempre muito reconhecida e agradecia com um bonito sorriso no rosto, já bem marcado pelo sofrimento.
E penso para comigo, que sermos gratos parece simples, mas não é. Nem sempre é fácil amarmos a vida tal e qual como ela se nos apresenta. Quando as circunstâncias nos são adversas é complicado sentirmo-nos gratos. Temos a tendência para avaliarmos a vida dos outros e acharmos que ela é muito melhor do que a nossa, ao mesmo tempo que lamentamos muitas vezes a nossa imerecida falta de sorte. Depois, quando a vida nos sorri e estamos a passar por momentos mais felizes e ficam para trás as frustrações e dificuldades por que passámos, consideramo-nos merecedores duma recompensa. É compreensível que, em tempos de crise , nos lamentemos e choremos as nossas desilusões, os nossos fracassos e desgostos. Mas a pouco e pouco, com o passar do tempo, eles vão-se dissipando e deixamos de vê-los como resultantes da nossa falta de sorte, mas antes como fazendo parte da vida. Viver o presente, com tudo aquilo que ele tem para nos dar, impõe deixar de pensar no futuro com a ilusão de que sempre iremos viver melhores dias, criando assim fantasias sem fundamento. Implica também que devemos saber agradecer e dar valor a tudo o que o presente nos dá.
Dar e receber, uma partilha de sentimentos, que, com o desenrolar da vida, se tornam num bem-estar, numa satisfação, indispensáveis para uma vivência feliz, nunca esquecendo de saber dar sempre graças a Deus pela nossa vida, com os seus momentos bons e menos bons, vividos com os nossos familiares e amigos, compreendendo que faz sentido vivê-la em pleno.

segunda-feira, 13 de outubro de 2008

domingo, 12 de outubro de 2008

A FALTA DE VALORES

Que sociedade é esta em que nós vivemos ? Tudo é permitido, vão-se abdicando de valores outrora tão valiosos, que os pais procuravam deixar como legado aos seus filhos. Não eram exclusivos duma classe socialmente bem situada. Os mais humildes, na sua simplicidade, educavam os seus filhos desde bem cedo, com regras morais e religiosas, para que pela vida fora fossem pessoas honradas, com sentido do dever cumprido. Nesse tempo, a expressão “ dou a minha palavra de honra” tinha um significado muito forte. Não era dita à toa, transmitia confiança, verdade, respeito. Hoje caiu em desuso e se, por mero acaso, é pronunciada, temos de pensar muito bem na sua veracidade, naquilo que estará por detrás das palavras. Vivemos numa sociedade em que o lema é “cada um salvar-se como puder”, não importa os meios que são usados para se atingirem os fins desejados. E é preocupante, assistirmos a casos, em que as próprias crianças já demonstram atitudes inquietantes, e que nos levam a interrogarmo-nos que cidadãos serão amanhã… Mas elas são fruto dos dias que se vivem, do pouco tempo que os pais têm para falarem com elas, para acompanharem o seu desenvolvimento. Quantas dessas crianças têm a chave de casa no bolso porque lá não está ninguém para lhes abrir a porta? Sozinhos em casa, navegar na Internet, se a possuem, aguça a sua curiosidade e leva-os, sem o acompanhamento dos adultos, a descobrir programas inadequados e perigosos. Claro que não se pode generalizar, há muitas crianças e adolescentes que sabem fazer escolhas, seguir os conselhos dos mais velhos, e que vão conseguindo orientar-se sob determinados princípios que os evidenciam nos estudos, no comportamento em geral. São eles as nossas esperanças para um mundo mais humanizado.
Na verdade, os tempos estão difíceis. Muitas vezes chega a não haver o mínimo para sobreviver. O emprego pode não estar garantido, mas as despesas crescem porque se passou também a não saber prescindir de certos “luxos”. As preocupações aumentam e as pessoas vão deixando de ter tempo para parar e pensar, e ter em atenção certos limites que não deveriam ter sido ultrapassados, mas que as pressões a isso as obrigaram.
Há valores que estão em crise, é o que se ouve dizer constantemente. O respeito que os outros nos devem merecer, o cuidado que devemos pôr nas atitudes que tomamos e naquilo que dizemos, a solidariedade, a partilha, a luta contra as injustiças, e por aí fora! Tudo isto se reúne no mandamento de Jesus: “Amar a Deus sobre todas as coisas e ao próximo como a ti mesmo”. E mais tarde reforçado nas palavras do apóstolo Paulo dirigidas aos crentes da igreja de Corínto : “ O amor é paciente e prestável. Não é invejoso. Não se envaidece nem é orgulhoso. O amor não tem maus modos nem é egoísta. Não se irrita nem pensa mal. O amor não se alegra com uma injustiça causada a alguém, mas alegra-se com a verdade. O amor suporta tudo, acredita sempre, espera sempre e sofre com paciência. O amor é eterno …Agora existem três coisas: fé, esperança e amor. Mas a mais importante é o amor”. I Coríntios 13.
Que mais posso eu acrescentar?

sábado, 4 de outubro de 2008

UM EXEMPLO DE DEDICAÇÃO E ABNEGAÇÃO

Com o passar dos anos tem-se vindo a acentuar a impossibilidade das famílias para cuidar dos seus idosos. Cada vez abrem mais lares mas, apesar disso, todos eles, pelo que sei, têm listas de espera, pois não conseguem abranger o número de idosos que precisam de lugar para ali passarem a viver, em condições dignas, o tempo que Deus lhes irá ainda conceder de vida. Não é fácil, e digo-o por experiência. Quem tem uma profissão e está fora de casa a maior parte do dia, e sem ajuda de terceiros, cuidar do seu familiar idoso, quando este vai perdendo as suas capacidades e fica dependente de ajuda continuada, é muito difícil. Encontrar alguém que se responsabilize a tempo inteiro ou só durante parte do dia para tomar conta e dispensar os cuidados necessários a um idoso, torna-se muito complicado, assim como também suportar os honorários que são pedidos. Por outro lado, há que ter muito cuidado com o tipo de pessoa a quem se vai entregar esse serviço, a sua preparação face aos cuidados que deve prestar ao idoso, o respeito que este lhe merece, a sua sensibilidade face às dificuldades que vão surgindo, e tantas coisas mais. É um problema que se está a pôr cada vez mais na nossa sociedade e que nem sempre é fácil de resolver.
Mas há ainda pessoas idosas que têm familiares disponíveis para deles se ocuparem, com dedicação e amor, proporcionando-lhes a melhor qualidade de vida possível. Tenho uma amiga, também ela já com 81 anos, que partilha a sua casa com uma familiar de 93 anos, numa situação de demência, senilidade, inconsciente face às atitudes que toma e que a tornam por vezes agressiva, inquieta, difícil de controlar nas suas exigências. Mas esta minha amiga está ali para cuidar dela com carinho, não importa que tenha de renunciar a muitas coisas em que gostaria de ocupar os seus dias. Há vozes que a alertam para ter cuidado consigo própria, que a aconselham a pôr a sua familiar num lar porque está a tornar-se difícil conseguir manter uma vivência saudável, tranquila, e sucedem-se os avisos, os conselhos. Mas para ela cuidar da sua familiar não é um fardo e o seu amor impede-a de virar as costas às dificuldades que se vão avolumando. Apesar da sua idade, esta minha amiga é uma pessoa activa, de espírito aberto ás mudanças, uma mulher que ainda tem muito para nos dar. Mas a sua familiar tem a prioridade e vai sempre poder contar com ela!
Um exemplo de dedicação e abnegação!

terça-feira, 23 de setembro de 2008

quarta-feira, 17 de setembro de 2008

CADA UM DIVERTE-SE À SUA MANEIRA


Olhando de novo as últimas imagens do meu blog não posso deixar de pensar nas diferentes maneiras que as pessoas inventam para preencher os seus momentos de ócio, indiferentes aos riscos que possam correr, no ridículo a que por vezes se expõem e, em algumas situações, no uso de métodos brutais , para depois se vangloriarem da sua valentia e do gozo que experimentaram.
Cada um é livre de se divertir da maneira que entende, nem que para isso tenha de sofrer as “meiguices” dum pequeno touro desembolado, como demonstram as imagens. Tenho a certeza que muitos daqueles homens (parece-me que as mulheres não se aventuraram nas brincadeiras !) sofreram traumatismos, partiram cabeças e sei lá que mais, mas isso não os vai impedir de, na próxima vez, tornarem a ser participantes activos desta diversão.
Mas o que me dirão dos espectáculos que proporcionam as “lutas de cães”, as “lutas de galos”, por exemplo, quando, incitados pelos gritos dos seus aficionados, os animais morrem e os que ficam estropiados são muitas vezes abandonados pelos seus próprios donos, porque a brincadeira terminou. E as touradas? Isso já é outra coisa! É um espectáculo com tradição, que passa de pais para filhos e que envolve famílias, normalmente abastadas, e que, com toda a pompa e valentia, proporcionam um clima de prazer, expectativa e uma certa tensão aos seus admiradores. Que me perdoem os simpatizantes das corridas de touros, mas eu sou completamente contrária ao sofrimento que é infligido aos animais, incluindo o cavalo que tantas vezes é atingido, para satisfação daquelas pessoas que, pagando bilhetes de elevado custo, se maravilham com a arte e valentia revelada pelo cavaleiro e pelo toureiro, quando vão espetando as bandarilhas, uma após outra, no animal, indiferentes ao seu sofrimento. Os “olés” gritados pela assistência, estimulam os “artistas” ! No final o público deixa as bancadas, maravilhado e comentando com euforia a actuação dos seus heróis, enquanto o pobre do touro, figura principal da festa, acaba no matadouro…
Numa tourada a minha pena vai para o touro e para o cavalo, quando este é atingido. Claro que não fico insensível se um dos “actores da arena” sofre um acidente, mas foi uma consequência da sua opção … Os animais estão sujeitos à vontade do homem, mas estes devem compreender que nem sempre podem levar a melhor, quando os excitam e lhes provocam sofrimento.
Estes são apenas “algumas” das maneiras que nós, humanos, escolhemos para diversão. Haveria tanto a dizer sobre isto !...

domingo, 14 de setembro de 2008

terça-feira, 9 de setembro de 2008

segunda-feira, 8 de setembro de 2008

PARA QUÊ SOFRER


“A nossa herança cultural baseia-se em ressaltar aquilo que fazemos mal. Incute-nos que é impossível viver sem sofrimento. E, contudo, a Psicologia considera que em quase 90 por cento das situações sofremos de forma inútil e desnecessária.”

“O sofrimento, o envelhecimento, a doença, a morte existem. Não se trata de negar essas evidências. Mas há que buscar um equilíbrio em que se possa viver com naturalidade. Não temendo a morte, nem o envelhecimento e sabendo que a doença se pode superar. Não há que negar que existem dificuldades. Há que preparar a pessoa para as superar.”

“Nem tudo é sofrimento, nem tudo é felicidade. Há que ser objectivo e saber que é possível superar as dificuldades. É esse o caminho para a maturidade e para a felicidade.”

“… existem inúmeras situações em que sofremos de forma desnecessária. Não pelo que ocorre mas pelo que pensamos. É esta situação que podemos inverter, colocando o cérebro a nosso favor. O sofrimento existe, mas não há que dar-lhe a primazia.”

“A felicidade advém de nos sentirmos bem connosco próprios, de sabermos que existe coerência entre o que pensamos e o que fazemos.”

“O sentido de humor ajuda a viver melhor, a relativizar e a superar as dificuldades. O sentido de humor é o melhor baluarte que podemos ter. Connosco próprios e no relacionamento com os outros. Graças ao humor desfazem-se muitos problemas.”

“O sentido de humor procura o positivo nas circunstâncias, o ponto agradável em tudo, relativiza as questões. Costumo dizer que “se o humor se pudesse pagar os ricos compravam-no”. Uma pessoa que é capaz de rir de si mesma supera quase todas as dificuldades e tem uma vida mais prazenteira”.

“O pior que podemos fazer a uma criança ou adolescente é superprotegê-lo.” … “Não negar que existem dificuldades na vida, mas prepará-los para as enfrentar e superar”

Excerto da Revista XIS do Jornal Público, de 1 de Julho de 2006
Do livro “A Inutilidade do Sofrimento”, da psicóloga Maria Jesus Álava Reyes

Há já algum tempo que, todas as manhãs e nos finais da tarde, eu vejo da minha janela um casal a dar pequenas voltas. O homem, talvez na casa dos 60 anos, deve ter tido algum problema de coração porque me parece que não pode mexer o braço esquerdo. Com a mão direita apoia-se numa bengala, e muito vagarosamente, num andar arrastado, dando pequeninos passos, ele faz a caminhada a que se impôs. A esposa vai sempre a seu lado, dando-lhe ajuda, mas só quando vê que é necessário fazê-lo. Não sei quanto tempo demora o trajecto, mas posso imaginar, pelo que vejo, que quando este homem chega a casa deve ir muito cansado. Mas ele é perseverante, determinado, sabe que precisa de andar, de movimentar as pernas. Ele não nega o sofrimento que esse esforço lhe causa, é visível, mas faz o possível por superá-lo, esforçando-se por, a pouco e pouco, ir tentando vencer as suas incapacidades, lutando para, quem sabe, voltar a ser a pessoa que era antes da doença o ter atingido.
Lembro-me mais uma vez das palavras da psicóloga: “O sofrimento existe, mas não há que dar-lhe a primazia !”

terça-feira, 2 de setembro de 2008

SABER VIVER

Muitas vezes, falando com pessoas que estão a passar por dificuldades e fogem ao convívio com os outros, eu costumo dizer, como incentivo : “Viva da melhor maneira cada dia da sua vida!” Também dirijo a mim própria as mesmas palavras, mas algumas vezes sem sucesso…
Estava há momentos a pensar que posso comparar a vida a uma daquelas estradas secundárias do nosso Portugal. Quando vamos de carro devemos ter em atenção os buracos, muitos deles sem estarem devidamente assinalados, as curvas, os outros carros que vêm em sentido contrário, aqueles que nos querem ultrapassar indiferentes ao perigo que isso possa constituir e a tantos outros imprevistos com os quais nos podemos deparar. Mas muito importante, é a maneira como conduzimos. E aqui surgem os “senãos” que podem pôr em risco a nossa segurança e a dos outros.
Na nossa “estrada da vida” vamos encontrar muitos obstáculos que irão atrapalhar a nossa condução: contrariedades, problemas que surgem sem serem esperados, o demasiado optimismo que nos impede de ver com clareza as realidades, a solidão, a falta de saúde, que nos torna mais sensíveis, enfim, muitas coisas das quais cada um de nós pode falar por si. Quando só vemos a parte negativa da vida é como se estivéssemos a conduzir o nosso carro pela estrada num dia de Inverno, com chuva, relâmpagos a cruzar o céu, o vento que nos obriga a segurar bem o volante para conseguirmos ir em frente, etc. Mas quando vamos para a estrada num dia de Primavera, com o sol a brilhar, os campo verdejantes, cobertos de flores, aquele túnel que atravessamos, formado pelas árvores, que dum lado e outro do caminho, entrelaçaram os seus ramos, o cantar dos pássaros, a total revelação da Natureza cantando hinos ao seu Criador! Então, sim, o nosso ser vibra, sentimo-nos mais felizes, esquecemos por momentos os perigos que nos podem surpreender, uma curva mal dada, um buraco traiçoeiro à espera do menos atento.
Saber aproveitar cada dia que Deus nos dá é aprender a tirar partido da nossa condução pela “estrada da vida”, aproveitando os “dias de Primavera” que nos irão tornar mais fortes para aprendermos a viver com as tristezas dos “dias de Inverno” que, quer queiramos quer não, aparecem sempre e…quantas vezes fora de tempo!
“Segura a mão de Deus.
Segura a mão de Deus,
Pois ela, ela te sustentará.
Não temas, segue adiante,
E não olhes para trás.
Segura já na mão de Deus e vai”

sexta-feira, 29 de agosto de 2008

FALTA DE SEGURANÇA

Apesar de sermos um pequeno país, conhecido até pelos seus brandos costumes, cada vez mais estamos a ser confrontados com problemas que, há uns anos atrás, seria difícil imaginar que pudessem tornar-se em notícias diárias nos órgãos de comunicação. Talvez a apresentação continuada de certos filmes americanos, e não só, se tenha tornado ao longo do tempo em fontes de aprendizagem para certas pessoas que , sem qualquer constrangimento, se tornam insensíveis aos meios que usam para alcançar os seus fins. A mente humana pode ficar de tal maneira distorcida que leva a alterações comportamentais para as quais não há uma explicação. E aquele que até era conhecido por ser um “bom tipo”, de um momento para o outro passa a ser procurado pela polícia pela prática de um crime. São situações que nos deixam perplexos, atemorizados e mais cautelosos. Hoje em dia, no café, no banco, na rua, podemos estar sujeitos a situações perigosas, quando nada as fazia prever. Faz-me lembrar aqueles filmes do “far west “ americano, quando o cowboy, por dá cá aquela palha, rapidamente puxa da arma, prime o gatilho e atira à esquerda e à direita, para depois voltar a pôr a arma no coldre, montar no cavalo e desaparecer.
Admira-me a facilidade com que se podem adquirir armas no nosso país. É frequente vermos na televisão, quando a polícia consegue desmantelar redes criminosas ou simplesmente capturar alguém que estava a ser procurado, a quantidade de armas de diferentes calibres que vão encontrar nas suas casas. Para mim, que pouco ou nada sei dos meandros que envolvem todas estas práticas criminosas, torna-se difícil compreender os sentimentos que movem estes homens, tão friamente e duma maneira completamente irracional, a cometer actos de violência que chegam a atingir a selvajaria. Duma coisa eu acho que estou certa: na maioria dos casos, estes actos não são praticados por pessoas levadas a extremos para conseguirem sobreviver. É, sim, uma maneira fácil de arranjar dinheiro sem precisar de trabalhar e uma espécie de jogo com as autoridades, até porque muitas vezes são eles que saem a ganhar. Devíamos ser informados, quando acabam por ser capturados, sobre quem são, donde provêm. Não virão apenas daqueles bairros problemáticos, onde a violência se torna mais evidente, consequência de situações que não foram tomadas em conta quando foram construídos e quem iria habitá-los. Haverá, tenho a certeza, gente de outros extractos sociais e que não “interessa” denunciar. O mal não vem só de um lado, tal como o vento, que sopra de vários quadrantes.

segunda-feira, 25 de agosto de 2008

SALTOS ALTOS

Quando a revista Tabu, do jornal Sol, me chega às mãos todas as semanas, procuro logo as penúltimas páginas VIVER PARA CONTAR de José António Saraiva. Leio-as duma ponta à outra e volto a lê-las depois com maior atenção deixando-me envolver no desenrolar do tema que o jornalista escolheu para essa semana. Confesso que não aprecio escritas muito elaboradas, ainda mais quando aparecem em revistas e jornais que serão lidos por pessoas de culturas diferenciadas e que devem poder compreender aquilo que vão ler. A minha preferência vai para este jornalista que sabe escrever estas páginas numa linguagem simples, um pouco irónica, inteligente, reveladora da veracidade do assunto que vai desenvolvendo ao longo da escrita e que se torna perfeitamente acessível a todos os leitores. Ele procura dar a sua opinião sobre determinadas realidades da nossa sociedade, que por vezes podem escapar aos mais atentos, porque, normalmente, não são assuntos que fazem notícia nos telejornais, nos noticiários da rádio ou nos cabeçalhos dos jornais.
Aqui deixo algumas passagens do artigo Saltos Altos, de 19/7/08, na revista Tabu, que li com muito agrado.

“A sociedade de consumo banalizou-se a tal ponto que perdemos em relação a ela o sentido crítico, aceitamo-la passivamente, deixámos de nos questionar sobre os expedientes que constantemente se inventam para nos obrigar a consumir mais e mais – mesmo em período de crise, como o que atravessamos.
Parece existir uma espécie de “central” que emite ordens e cria diariamente novas fórmulas, novos modelos, para incentivar o consumo”.

“Há trinta anos, a maioria das pessoas tinha um relógio. Os nossos avós tinham um relógio a vida inteira – um Ómega, um Tissot, um Longines, marcas que ficaram míticas por serem “eternas”. Quando se comprava um relógio era para sempre – não se trocava de relógio por dá cá aquele palha, tal como não se trocava de mulher ou de marido”.

“E o que acontece com os relógios sucede com os sapatos. Há 30 anos as senhoras tinham meia dúzia de pares de sapatos: sapatos de Verão e de Inverno, sapatos mais claros e mais escuros, um par de cerimónia.
Mas também isso mudou. Depois, no que respeita aos modelos: tão depressa se usam sapatos com longas biqueiras (que ficam vazias, porque os pés não chegam à frente, o que provoca a rápida deformação do calçado) como sapatos completamente arredondados ( fazendo lembrar os das chinesas a quem punham ligaduras para não deixar crescer os pés)”.

“Quem “inventa” isto? Como são lançadas as “ordens” que depois todos seguem? Às vezes, como disse, parece haver uma “central de comando” a emitir orientações – que as grandes empresas, as multinacionais, os estilistas se encarregam de pôr em prática.
Parece existir uma espécie de “Deus do consumo” que constantemente inventa novas formas de o expandir, de criar necessidades fictícias e modas absurdas que chegam a ridicularizar quem as adopta”.

domingo, 17 de agosto de 2008

NÃO DESANIMEMOS

Há pouco tempo, quando fazia o voluntariado no Hospital, passei por uma experiência muito gratificante. Entre o grupo de doentes que ali se encontrava nesse dia, dois deles, com quem já tenho conversado algumas vezes, porque se sentiam muito deprimidos, não quiseram conversar. Um outro ainda disse algumas palavras, mas eu notei que também não estava bem. Isto já tem acontecido, mas muito raramente. Compreendi perfeitamente a situação porque eu constato que, quando se luta com uma doença que muitas vezes teima em resistir à medicação que é administrada, as pessoas deixam-se levar pelo desânimo e começam a perder a coragem para lhe fazer frente. Nessa manhã, eu também não estava nos meus melhores dias e o ambiente, que eu sentia no ar um pouco pesado, contribuiu ainda mais para perturbar a minha disposição.
A minha atenção foi desviada para um doente com quem eu havia falado na semana anterior pela primeira vez. Estava com problemas e tinha resolvido vir falar com a médica. Aparenta ser uma pessoa que não se deixa vencer facilmente, com uma vida marcada por várias experiências que lhe deixaram lesões no corpo, mas com muita força para enfrentar a doença e continuar a fazer planos para o futuro. Era a segunda vez que nos encontrávamos. A dada altura, ele diz-me a sorrir: “ A senhora está triste!” Respondi-lhe : “Não! Talvez um pouco abatida porque vejo algumas pessoas, que aqui estão hoje, muito deprimidas”. Ele disse algumas palavras, confirmando que havia momentos em que se perde a coragem, mas insistiu : “A senhora hoje não está bem !” Olhando para ele, ri-me e respondi: “ Estou bem!”
Então ele, num tom de voz animador, disse-me: “ Vá, deixe sair esse lindo sorriso que a senhora tem!” Entretanto a médica apareceu e a nossa conversa ficou por ali. E eu fiquei a pensar que este doente, por momentos, esqueceu os seus males e foram aquelas palavras que ele encontrou para me animar!
Quantas vezes, no meu dia-a-dia, eu fico insensível a um olhar que deixa transparecer tristeza, uma palavra que exprime um sentimento de desânimo, uma atitude mais brusca que denuncia impaciência, porque estou demasiadamente preocupada comigo própria e não me apercebo dos problemas dos outros.
Há umas semanas atrás, uma das doentes, já de certa idade, recordava o sofrimento em que o seu marido tinha vivido antes de falecer e, chorando, lamentava estar ela agora também a passar por momentos bem difíceis. Então, surgiu de imediato um comentário expresso com bastante firmeza, por uma outra doente bastante mais jovem: “ Não somos só nós que sofremos, todas as pessoas sofrem!” E é bem verdade…

quinta-feira, 14 de agosto de 2008

VIVER CADA DIA COMO SE FOSSE O ÚLTIMO É UM ERRO

“ A felicidade não é uma estado acabado. O bem-estar, como prefiro chamar-lhe, consiste num processo dinâmico que se rege pelo facto de estarem, em permanência, a surgir novos acontecimentos na nossa vida. Se soubermos efectuar a gestão da vida no presente, numa atitude de gratidão por aquilo que hoje existe e não numa atitude de medo por aquilo que amanhã pode vir a existir ou deixar de existir, estamo-nos a centrar no real. Ou seja, quando nós projectamos ou sofremos por antecipação, descentramo-nos do presente para equacionar o futuro de uma forma emocionalmente desajustada – com todos os sentimentos de medo e insegurança que acarretam essas possíveis alterações. E não temos capacidade para gerir todas estas emoções. Ou eu olho para o que não existe, ou para o que tenho medo que deixe de existir, ou olho para aquilo que existe e tento sentir-me grata por isso".

”Viver cada dia como se fosse o último?

“Se for o último, corremos o risco de viver numa voracidade e numa velocidade incessante, a querer efectuar actos disparatados. É querer empacotar a vida em meia dúzia de horas, com a angústia de que ela vai terminar, ainda por cima. Pelo contrário, penso que cada dia deve ser vivido como sendo o dia mais importante das nossas vidas. Se eu viver cada dia como o melhor dia, em conformidade com as circunstâncias, irei sentir-me bem".

“Se nós soubermos, no final de cada dia, parar um pouco para reflectir e ganhar o hábito de equacionar cinco coisas boas que nos aconteceram nesse dia, começamos a aprender a valorizar os pormenores".

“Se começarmos a sentir, realisticamente, mas com intensidade, as pequenas coisas do dia-a-dia – o abrir a janela e olhar a chuva e sentir o cheiro da terra húmida, ou abrir a janela e olhar o céu azul e o sol e apreciar os primeiros raios do dia, passar num café e sentir o aroma do café – começamos realmente a apreciar a vida.”

" A felicidade passa por congratular-se com a felicidade e a beleza dos outros e, acima de tudo, com a coerência entre aquilo que eu penso, o que eu sinto e o que eu faço. É uma forma de estar na vida securizante".

Margarida Corvo Tavares, psicóloga
Excerto da Revista XIS do Jornal Público, de 24 de Junho de 2006

quarta-feira, 13 de agosto de 2008

terça-feira, 5 de agosto de 2008

Imaginem

"Imaginem que todos os gestores públicos das setenta e sete empresas do Estado decidiam voluntariamente baixar os seus vencimentos e prémios em dez por cento. Imaginem que decidiam fazer isso independentemente dos resultados.
Se os resultados fossem bons as reduções contribuíam para a produtividade. Se fossem maus ajudavam em muito na recuperação. Imaginem que os gestores públicos optavam por carros dez por cento mais baratos e que reduziam as suas dotações de combustível em dez por cento.
Imaginem que as suas despesas de representação diminuíam dez por cento também. Que retiravam dez por cento ao que debitam regularmente nos cartões de crédito das empresas. Imaginem ainda que os carros pagos pelo Estado para funções do Estado tinham ESTADO escrito na porta. Imaginem que só eram usados em funções do Estado.
Imaginem que dispensavam dez por cento dos assessores e consultores e passavam a utilizar a prata da casa para o serviço público. Imaginem que gastavam dez por cento menos em pacotes de rescisão para quem trabalha e não se quer reformar. Imaginem que os gestores públicos do passado, que são os pensionistas milionários do presente, se inspiravam nisto e aceitavam uma redução de dez por cento nas suas pensões. Em todas as suas pensões. Eles acumulam várias. Não era nada de muito dramático. Ainda ficavam, todos, muito acima dos mil contos por mês.
Imaginem que o faziam, por ética ou por vergonha. Imaginem que o faziam por consciência. Imaginem o efeito que isto teria no défice das contas públicas. Imaginem os postos de trabalho que se mantinham e os que se criavam. Imaginem os lugares a aumentar nas faculdades, nas escolas, nas creches e nos lares. Imaginem este dinheiro a ser usado em tribunais para reduzir dez por cento o tempo de espera por uma sentença. Ou no posto de saúde para esperarmos menos dez por cento do tempo por uma consulta ou por uma operação às cataratas.
Imaginem remédios dez por cento mais baratos. Imaginem dentistas incluídos no serviço nacional de saúde. Imaginem a segurança que os municípios podiam comprar com esses dinheiros. Imaginem uma Polícia dez por cento mais bem paga, dez por cento mais bem equipada e mais motivada. Imaginem as pensões que se podiam actualizar. Imaginem todo esse dinheiro bem gerido. Imaginem IRC, IRS e IVA a descerem dez por cento também e a economia a soltar-se à velocidade de mais dez por cento em fábricas, lojas, ateliers, teatros, cinemas, estúdios, cafés, restaurantes e jardins.
Imaginem que o inédito acto de gestão de Fernando Pinto, da TAP, de baixar dez por cento as remunerações do seu Conselho de Administração nesta altura de crise na TAP, no país e no Mundo é seguido pelas outras setenta e sete empresas públicas em Portugal. Imaginem que a histórica decisão de Fernando Pinto de reduzir em dez por cento os prémios de gestão, independentemente dos resultados serem bons ou maus, é seguida pelas outras empresas públicas.
Imaginem que é seguida por aquelas que distribuem prémios quando dão prejuízo. Imaginem que país podíamos ser se o fizéssemos. Imaginem que país seremos se não o fizermos".

Mário Crespo
JN

segunda-feira, 4 de agosto de 2008

FILHOS CRIADOS ...

Quando somos novos e temos filhos pequenos, com todas as preocupações e canseiras que eles nos dão, eu, na minha inexperiência, pensava que, quando eles fossem adultos, senhores das suas vidas, independentes, iria ficar descansada e viver sem sobressaltos.
À medida que cresceram foram passando pelas fases que caracterizam cada idade. As birras terminaram, foram ultrapassadas as doenças da infância: a varicela, o sarampo, alternadas com outros problemas de saúde que sempre surgem nestas idades. Partiram a cabeça, esfolaram joelhos, brigaram com os colegas e gozaram a liberdade de brincar na rua uns com os outros, o que, nos tempos actuais, é raro ver-se porque há sempre possíveis perigos à espreita. Chegaram à adolescência e as preocupações foram aumentando. A importância que os amigos representavam para eles, fizeram-me recear a possível má influência que poderiam vir a ter nos seus comportamentos. Saber se as notas que tinham tirado dariam ou não para passar de ano, era uma expectativa, nem sempre com resultados positivos. Os namoricos… E as aventuras que eles viveram e só muito mais tarde me contaram ! Quando hoje as recordo ainda me fazem arrepiar.
Os anos passaram depressa e a saída de casa, para eles poderem continuar os estudos, chegou. Uma aventura para eles misturada também com certo receio, e para mim, uma ansiedade constante: como estariam a viver esta experiência, como ocupariam os tempos livres, etc ? Os fins de semana, quando chegavam a casa, com os sacos cheios de roupa suja, a alegria de os ver, as perguntas que tinha para lhes fazer e a pressa que sempre manifestavam para irem encontrar-se com os amigos… Por fim, a felicidade vivida quando eles terminaram os seus estudos e começaram a trabalhar. Depois chegou o momento de eles tomarem uma decisão importante e escolherem a pessoa com quem desejavam partilhar a vida. Constituíram as suas famílias e saíram para as suas casas. Agora, eu e o pai estávamos sós, iríamos poder viver a vida tranquilamente, porque as fadigas, as preocupações tinham terminado ! Isso pensava eu ! Não me lembrava do provérbio que diz: “Filhos criados, trabalhos dobrados”. Fui à enciclopédia e lá diz que “provérbio ou ditado exprimem metaforicamente uma verdade ou resumem uma experiência”. E nós, mães e pais que o digamos !
Os filhos tornaram-se adultos e agora eles gerem as suas vidas de acordo com os seus rendimentos familiares. São responsáveis pela educação dos seus filhos, tal como nós fomos. Têm as suas próprias opiniões, o seu conceito de vida, que ás vezes pode diferir do nosso. Tudo isto é absolutamente normal e é bom que assim seja. É claro que as minhas preocupações hoje são diferentes das do passado, mas, para mim, parecem-me ser ainda maiores ! Agora estendem-se às suas famílias. Os seus problemas são os meus problemas. Vivo intensamente as suas alegrias, mas fico angustiada e ansiosa se alguma coisa não lhes corre bem. Gosto de os ver independentes, realizados, cada um procurando ser feliz e fazer feliz a sua família. Porquê viver inquieta ?! Acho que o melhor que eu tenho a fazer é preocupar-me unicamente quando existam razões para isso, enfrentar o momento e mostrar-lhes que podem sempre contar com o meu apoio e ajuda. Assim é que deve ser ! O pior é que no meu coração, bem lá no fundo, eu sei que não consigo ser diferente. É superior às minhas forças ! E imagino que nesta questão não devo estar sozinha…

quinta-feira, 31 de julho de 2008

quarta-feira, 30 de julho de 2008

DA ERVA À ÁRVORE

“Eram dunas e dunas, a perder de vista. Montes de areia para o vento brincar…
Hoje, fazia uma duna maior aqui, amanhã apagava-a, para fazê-la mais além e, sempre segundo os seus caprichos, onde estavam montes, cavava vales, onde estavam vales, amoldava montes.
O vento era uma vassoura enorme.
Cabeleiras dóceis de ervinhas rasteiras deixavam-se pentear, despentear, ao sabor do vento gigante.
Ele é que mandava.
Uma delas à beira dum tojo só picos, cresceu.
Delgadinha que era, arriscou-se à vida. Rompera a areia e apontava para cima. Ela lá sabia.
De dentes a ranger, o vento passou. Partiu-se o tronquinho? Não se partiu. Fincava as raízes, segurava-se com toda a força e, quando o vento descia, inclinava-se à vontade dele. Tinha de ser assim.
Lá se foi aguentando. O vento, a princípio, nem dava por ela.
Era uma erva como as outras. Senhor daquelas dunas, o que ele queria era disciplina, ordem, submissão. A erva, que erva afinal não era, submetia-se. Óptimo.
Foi crescendo e o vento sem dar por ela. Era um tronco já. Uma arvorezinha de Natal para casa de bonecas. Outras ervinhas como, dantes, ela tinha sido, despontavam também, na mesma duna.
Ali havia uma pequena nação de pinheiros novos. A ordem era: persistir. Por enquanto persistir. Resistir seria para depois. E foram vingando.
Quando o vento deu por eles, teve uma grande cólera e soprou, dias a fio, sobre a duna, donde nascia, miudamente, frágil ainda, um sinal de rebeldia ao seu poder. Nada conseguiu. Os pinheiros sabiam que eram pinheiros.
Tinham raça e coragem para fazer frente ao vento.
Uns e outros, os maiores e os mais pequenos, começaram a olhar para a sombra. Alastravam para outras dunas. Guerreiros chamavam por outros guerreiros e desafiavam o vento. “Nada podes contra nós”, gritavam-lhe.
O maior, o chefe, o mais velho, que da erva se fez tronco, do tronco se fez árvore, comandava a defesa e dizia aos mais novos, nas alturas em que o vento lhes fazia ranger os ramos: “Aguentem, que já passámos por pior.” Eles aguentavam.
E foi assim que o vento, o gigante caprichoso que dantes arrasava dunas, teve de deixar de fazer castelos na areia.”

Texto de António Torrado
Revista do Jornal de Notícias
21 Março 2004
Dia da Árvore

Gostei muito desta história e li-a várias vezes, procurando pequenos pormenores que ganhavam diferentes significados. À medida que o fazia, surgiu-me a comparação entre as pequeninas ervas que iam nascendo nas dunas, fustigadas pelo vento, que teimava em derrubá-las, e cada um de nós, na nossa caminhada neste mundo. Como servos de Deus, procuramos manter bem firme a nossa fé n’ Ele, mas também, tal como as pequeninas ervas, estamos constantemente a ser sujeitos aos sopros violentos dos ventos, que nos fragilizam e fazem que vacilemos na nossa vida espiritual. Mas há duas palavras muito importantes que se destacam nesta pequena história: “ persistir” e “resistir”.
A pequenina erva, que junto dum tojo cheio de picos, foi crescendo, fortalecendo, até que se tornou num pequenino pinheiro, ao mesmo tempo que outras ervinhas começavam a desenvolver-se na mesma duna. Haviam já muitos pinheiros novos que persistiam em crescer e a resistir à cólera do vento que insistia em derrubá-los. Embora as suas rajadas se tornassem cada vez mais fortes e constantes, ele nada conseguia porque “os pinheiros sabiam que eram pinheiros” e tinham força e não temiam fazer-lhe frente.
Tal como estes pinheiros nós temos de “persistir” no crescimento da nossa fé, na nossa relação com Deus e com os outros para conseguirmos “resistir” às muitas dificuldades com que nos vamos deparando ao longo da vida. Temos de ter forças para ultrapassá-las e gritar , tal como os pinheiros ao vento: “Nada podeis contra nós”. E à medida que vamos vencendo os problemas, quando outros surgem, dizermos para nós e para os outros: “Aguentemo-nos, porque já passámos pelo pior”. Desta forma, a nossa fé sairá mais fortalecida e alicerçada Naquele que é o Senhor das nossas vidas !

domingo, 27 de julho de 2008

NÃO É FÁCIL EDUCAR !

Quando ainda era jovem já pensava que criar os filhos, educá-los, prepará-los para a vida, era uma tarefa bem difícil. Como filha única que fui, as preocupações dos meus pais estavam apenas centradas em mim, mas tinha vizinhos com 3 e 4 filhos e via as dificuldades que passavam para conseguir manter a ordem em casa.
Como todas as crianças, fiz birras, travessuras, maldades, mas logo me era chamada a atenção com o elevar da voz, umas boas palmadas ou chineladas, dadas pela minha mãe, mais nervosa e pronta a reagir às infracções. Ainda nova ela começou a sofrer de problemas reumáticos, de modo que o uso do chinelo aliviava-lhe as mãos doridas. Mas, se alguma coisa de mal me acontecia, a minha mãe entrava em verdadeiro estado de pânico ! O meu pai era um homem muito calmo, mas recordo-me muito bem de me ter dado uma vez com o cinto ! Lá vinha o ditado : “Quem dá o pão, dá a educação”.
Eu nunca guardei mágoa ou achei imerecidos os castigos que me foram aplicados. Eram assim os tempos e a punição física fazia parte do processo educativo no lar e na escola. Compreendi mais tarde que, em certos momentos, quando as pessoas estão mais fragilizadas por uma irritação mal contida, um estado de saúde mais debilitado e por muitas outras razões, pode perder-se a cabeça e as crianças, como seres mais fracos, sofrerem as consequências. Claro que isto é condenável, mas acontecia e ainda pode acontecer, não tenho dúvidas.
As experiências da vida, os conhecimentos que agora tenho dos estudos que têm sido feitos e das respectivas conclusões, levaram-me a considerar a educação das crianças com mais atenção. Mas posso dizer, contudo, que nem todas as teorias, agora muito divulgadas, me parecem satisfatórias. Teria muito coisa a dizer sobre isto. Concordo em absoluto que os castigos corporais não educam, mas só amedrontam e podem ser muito traumatizantes. Mas apesar de tanto se falar no assunto e das pessoas , duma maneira geral , saberem que as crianças devem ter um crescimento saudável, sem violências físicas, continuam a ouvir-se vozes que, de quando em quando, alertam para os maus tratos que crianças e jovens (e idosos !) recebem em algumas instituições, dentro de famílias com problemas sociais graves, e não só … Os pais devem estar bem informados dos métodos a adoptar na educação. Há normas que proíbem a punição física para combater a indisciplina e má educação. Há linhas telefónicas para uma criança pedir ajuda se sofrer agressões familiares. Há países que, se alguém ouvir gritos de crianças vindos da casa dum vizinho, devem logo alertar as autoridades competentes. O que se passa é que muitas vezes as criancinhas gritam porque estão com uma tremenda birra ou porque se recusam a obedecer. E lá estão os pais metidos em maus lençóis !
Duma coisa, porém, eu dou conta : Há muitas crianças na sociedade actual, que se tornam pequenos tiranos na família, porque tudo lhes é permitido. Realmente educar uma criança não é tarefa fácil ! Os pais têm de pensar muito bem antes de tomar uma atitude, serem pacientes, se tiverem meios financeiros recorrerem a um psicólogo infantil para serem orientados na educação dos filhos , de modo que eles cresçam felizes e não fiquem traumatizados. Mas cada especialista defende a sua teoria e cada criança merece uma atenção especial. Depois, os resultados nem sempre são satisfatórios, podem surgir insucessos na aplicação de determinados métodos que se pensavam ser os adequados. Os pais começam a sentir-se impotentes para gerir as situações que vão surgindo e passam a ser vistos como educadores pouco competentes, responsáveis por certos comportamentos dos filhos, que, para a sociedade, parecem ser menos normais… Tem havido, entre outras razões, há vários anos, uma vontade crescente e louvável de apelar para os direitos das crianças, mas elas também têm deveres e isso, talvez, tenha caído um pouco no esquecimento. Por outro lado, começou a haver receio de serem tomadas atitudes e usarem-se métodos que possam ser considerados “anti-pedagógicos”, um termo um pouco controverso. Passa-se assim para o outro extremo e gera-se a confusão. Que dor de cabeça !!!

quinta-feira, 24 de julho de 2008

quarta-feira, 23 de julho de 2008

REENCONTRO

Segunda-feira, como de costume, fui fazer voluntariado no Hospital da Figueira da Foz.
No início do ano, encontrei-me pela primeira vez com um homem alto, forte e ainda novo que estava a receber tratamento de quimioterapia. Por vezes, acontece-me experimentar um certo constrangimento antes de me dirigir às pessoas que ainda não conheço. Depende unicamente, eu sei, do modo como eu as vejo e do que as suas caras me parecem dizer. Novamente, eu verifiquei que muitas vezes estamos errados no juízo que fazemos das pessoas, antes mesmo de falarmos com elas. Hesitante, aproximei-me desse doente, e como sempre, disse: “Penso que é a primeira vez que nos encontramos ?” Só posso acrescentar que a nossa conversa durou longos minutos. Aquele homem imediatamente começou a desabafar. Falou, falou … Estava angustiado, triste, e, sem nunca me ter visto, falou-me da sua vida, das experiências dolorosas por que já tinha passado, da maneira trágica como tinha perdido um familiar muito chegado, e agora, quando passados já alguns anos, estava a viver uma fase mais tranquila, aparece a doença. Chorou ! Dirigi-lhe palavras de conforto, de esperança, mas, sobretudo, ouvi os seus desabafos. Encontrei-me com ele mais algumas vezes e via que ia ficando cada dia mais desanimado. Não se sentia bem, os tratamentos estavam a trazer-lhe efeitos secundários dolorosos. Deixei de vê-lo. Indaguei junto de outros “companheiros na caminhada” mas não sabiam o que se passava com ele. Comecei a ficar preocupada. Foi uma pessoa que me tocou profundamente.
Nesta segunda-feira, de súbito, vi-o entrar. Fui ter com ele e procurei saber como estava a passar.
Como o dia dos tratamentos tinha sido alterado, foi esse o motivo porque não o voltei a ver. Disse-me que já havia terminado os tratamentos, os resultados dos exames feitos tinham deixado a própria médica muito admirada, e ele, claro, muito feliz com a notícia. Então porque é que ele estaria de novo ali, pensei eu ? Neste último fim de semana tinha-se sentido mal e achou melhor ir falar com a médica. Estava desanimado, revoltado, triste… A sua companheira também estava com problemas de saúde. Voltou de novo ao passado, às cicatrizes que a vida lhe tinha deixado, à sua pouca saúde. Repetiu-me que tinha sido um cristão praticante, mas que agora a sua fé estava muito abalada. A dada altura disse-me “Minha senhora, eu vi no IPO de Coimbra, crianças a sofrer, que pouco ou nada sabem da vida. Porque é que sofrem tanto ?! Muitas vezes me interrogo , se Deus realmente existe …” É muito difícil para quem está a viver momentos tão dolorosos, aceitar de imediato explicações para as suas dúvidas .Tentei transmitir-lhe algumas palavras de conforto, justificar o porquê do sofrimento por que muitas vezes passamos, mas as palavras saíam-me com dificuldade, sem muita convicção, eu tinha noção disso. Eu também me interrogo, não sobre a existência de Deus, porque creio QUE ELE EXISTE E QUE O SEU AMOR É INFINITO ! Mas para o porquê de tanto sofrimento neste mundo eu não encontro as respostas que gostaria de ter e ouvir.
Lembrei-me, então, das palavras do nosso poeta Augusto Gil : “Mas as crianças, Senhor, porque lhes dás tanta dor ?!... Porque padecem assim ?!...”

terça-feira, 22 de julho de 2008

segunda-feira, 21 de julho de 2008

VAMOS À PISCINA !

Sou frequentadora assídua nas sessões de hidroginástica na piscina do Ginásio Clube Figueirense. Somos um grupo constituído quase na sua totalidade por mulheres de diferentes idades. Nos últimos meses, os homens são só dois ou três.
A água da piscina, por questões de saúde, deve estar só a 30 graus. Imagine-se no Inverno!
Depois de arranjarmos forças para enfrentar a dura prova de entrar na piscina , a pouco e pouco , o corpo vai habituando-se à temperatura. Aqueles que chegam primeiro vão-se divertindo à medida que chegam os colegas. À pergunta sacramental :”Como é que está a água?” vem logo a resposta:”Hoje está muito fria !” Depois começa a descida cautelosa pelas escadas, até que, já dentro de água, todos arrepiados , com pele de galinha, surgem as exclamações:”Ai, a água está gelada ! Brrr…” Ouvem-se algumas vozes, mas muito poucas, daqueles que, já dentro da água, afirmam corajosamente “Está boa !” Algumas vezes, quando o professor chega, começam os comentários:” A água hoje está muito fria, é impossível que esteja a 30 graus !” E lá vai ele buscar o termómetro e , pacientemente (às vezes !) assegurar que “até está a 32 graus !” Pouco convencidos, começamos os exercícios e vamos ficando mais quentes.
A cena repete-se quando saímos da água. Agora, com o corpo quente, depois de 45 minutos de exercícios, vamos ter de enfrentar o frio dos balneários. Ouvem-se de novo os queixumes:”Que frio ! Isto cada vez está pior !” E lá corremos para os duches, desejosos de sentir a água quentinha a escorrer-nos pelo corpo. Depois partimos a caminho de casa, com uma agradável sensação no corpo resultante dos exercícios que ajudam a tonificar os músculos e a dar mais mobilidade aos ossos.
Esta piscina não tem as condições necessárias e que agora são exigidas. Que o digam aqueles que conhecem as piscinas das Alhadas e do Paião. As portas e as janelas dos balneários estão empenadas e deixam passar o frio, as escadas para a piscina rangem e dão de si. A estes problemas outros se juntam , mas para mim, e sei que para muitas outras pessoas, apesar de todas as deficiências que originam os nossos desabafos, ela é a “nossa piscina”. E depois afeiçoámo-nos ao professor Paulo Martins, que, sempre bem-humorado e com calma, vai conseguindo que todos se esforcem para fazer os exercícios, mesmo quando, em cima daquelas pequenas placas de esferovite azul, nos tentamos equilibrar, movimentando as pernas para a esquerda e para a direita, para trás e para a frente…
Está planeada a construção duma nova piscina e, provavelmente, com condições superiores às que agora são consideradas excelentes. Quando? Não sabemos . Pensando na crise que estamos a atravessar, de que todos se queixam, pressinto que ainda vamos ter de esperar algum tempo, mais do que aquele que é desejável e urgente. Quando esse dia chegar, estou certa que aqueles, que ao longo dos anos utilizaram este espaço para praticarem as modalidades ali possíveis e todos os que ainda vão continuar a usá-lo, irão recordar esta piscina com um certo saudosismo porque há lembranças do passado que vão sempre ficar na nossa memória.

sexta-feira, 18 de julho de 2008

ESTAMOS A SABER ENVELHECER ?


Encontrei-me com uma amiga de longa data e, juntas, passeámos à beira-mar. Fizemos algumas compras e, depois, à mesa dum café, falámos da nossa vida, dos nossos familiares e veio à baila o envelhecimento de alguns dos nossos amigos e de todas as implicações que derivam desse processo.
Vim para casa a pensar no assunto e lembrei-me que, algumas vezes, ao longo da minha vida e observando o crescimento dos meus filhos, eu pensava, por exemplo: “Quando o meu filho mais velho tiver 50 anos eu já terei 74 anos. Como é que eu estarei na altura?” E olhava à minha volta, prestando atenção a mulheres com essa idade, imaginando-me como uma delas e pensava para comigo: “ A idade não perdoa…”
Se temos uma profissão e juntando às horas passadas fora de casa as tarefas domésticas, a vida não nos deixa tempo para darmos conta de alguns problemas que começam a surgir e que nos querem avisar que já não somos umas jovenzinhas. Mas, com tantas obrigações a cumprir, só há tempo para pensar no presente. Depois, passar um creme no rosto, mudar a cor do cabelo, procurar ter uma alimentação mais saudável, começar a ir ao ginásio, etc, são tácticas que adoptamos para fazer frente aos anos que vão começando a pesar.
Oiço muitas vezes dizer que quando uma criança nasce começa logo a envelhecer. Passa-se a primeira e segunda infância, depois chega a adolescência, a juventude e a idade adulta. Aqui o processo de envelhecimento processa-se mais rapidamente e nem as plásticas, por mais bem conseguidas que sejam, conseguem travá-lo.
A minha realidade, a nossa realidade, é que vamos envelhecendo quer queiramos quer não, por mais esforços que façamos para parecer mais jovens.
A idade é uma dádiva de Deus. Sabemos que iremos sofrer um conjunto de transformações morfológicas, fisiológicas e até psíquicas que vão surgindo como consequências da acção do tempo sobre todos os seres vivos, mas o que nos diferencia deles é que somos um valor a respeitar, somos senhores de nós próprios, dos nossos actos e temos dignidade própria.
Todos nós podemos tirar partido do tempo livre que temos , da saúde que vamos gozando, de todo um conjunto de possibilidades que nos podem ajudar a sermos úteis ao nosso semelhante na comunidade em que estamos inseridas. Mesmo que no nosso corpo comecem a ser visíveis as marcas dos anos que já temos, que o nosso espírito se mantenha jovem e saibamos acompanhar as realidades do mundo que nos rodeia.

segunda-feira, 14 de julho de 2008

AJUDAR, MAS COMO ?!


Vou algumas vezes visitar uma senhora amiga. Há vários anos, depois da morte dos seus pais, foi-se isolando a pouco e pouco, fechando-se em casa, evitando o convívio com as pessoas. Tem 80 anos, sem família, e a enfrentar um problema grave de saúde. Quando era nova e durante bastante tempo e enquanto a vista lho permitiu, trabalhou para fora em ponto de “ajour”. Vive na parte antiga da cidade numa casa velha e degradada. O telhado deixa entrar a água da chuva que atravessa o sobrado do sótão e lhe cai na cama. A porta da cozinha, que dá para o quintal, tem muitos vidros partidos, deixando entrar o frio. O gás já há muito acabou na botija, há pelo menos dois anos, e não a substituiu nem deixa que o façam (agora também é um perigo porque as borrachas já devem ter passado há muito o prazo de validade). Há alguns anos quiseram instalar-lhe um telefone em casa , para , em caso de necessidade, pedir ajuda. Não deixou. “Nunca tive telefone e agora também não preciso” foi a resposta.
Deixou de cozinhar mas conseguiu-se que o almoço lhe fosse servido por uma instituição de solidariedade da nossa cidade a troco duma pequena importância, pois recebe a reforma mínima. As condições higiénicas em que vive são deploráveis, mas não deixa que a ajudem a limpar a casa. A máquina de lavar a roupa funciona, mas não a utiliza …Por iniciativa própria não leva o lixo para o contentor, só com a imposição duma amiga que a ajuda nessa tarefa. Só sai de casa de manhã bem cedo para ir comprar o pão e uma vez por mês para ir aos Correios receber a pequena reforma e pagar a água e a luz.
É uma mulher que vive na solidão a que se votou e que não quer ser ajudada … Num dia frio de Inverno recusou a oferta dum termo com água quente para fazer um chá e sentir-se mais quentinha. Mas se levamos um bolo ou um doce aceita, fica contente. Vá lá !
Entretém-se a ver alguns programas da Sic mas não muda de canal com receio de mexer no comando e avariar o sistema. É bom que, pelo menos, continue a procurar esta distracção, a única que tem !
Alerto-a muitas vezes para ter cuidado porque pode ter algum acidente em casa e ali ficar sem assistência, pois os vizinhos podem não dar pela sua falta. Responde-me , quase a chorar, “O Senhor vai ajudar-me, o Senhor não me desampara…” Respondo-lhe “Deus ajuda, mas nós temos de fazer a nossa parte”.
O ano passado fui falar com o Delegado de Saúde para pedir, se possível, a sua intervenção e saber o que poderia ser feito. Ele já conhecia a situação porque, meses antes, duas técnicas de serviço social a tinham visitado. É um homem muito afável, recebeu-me bem. Depois de termos analisado toda a situação e eu lhe falar da necessidade urgente da senhora sair daquela casa, que não oferece o mínimo de condições, da possibilidade de ela ir para um lar, onde pudesse ser bem tratada, ter uma cama limpa para se deitar, refeições quentes, enfim, tudo aquilo a que o ser humano tem direito, ele disse-me, mais ou menos estas palavras : “Enquanto ela estiver lúcida, saber aquilo que quer, ninguém pode tirá-la de casa. Só com um mandato da justiça, que só é passado se ela estiver transtornada da cabeça , sem capacidade para estar sozinha”.
A senhoria da casa onde vive já lhe propôs ir habitar uma casa mais pequena, quase ao lado, que tem boas condições, só que, disse ela :”A mobília que eu tenho não cabe lá e eu não me quero desfazer dela”. Houve também a possibilidade de ir passar 15 dias a um lar, longe da Figueira da Foz e dirigido por pessoas suas conhecidas , apenas para ver se gostaria de lá ficar, mas, claro, não quis ir…
Que mais se pode fazer quando uma pessoa não deixa ser ajudada?!
“Muitas pessoas vivem nestas condições, e pior ainda, na cidade”, foi-me dito.
Será que estas pessoas estão no pleno gozo das suas faculdades mentais, têm elas a perfeita lucidez das suas incapacidades para levarem uma vida mais ou menos normal ? Porque não compreendem elas que precisam de ajuda? Eu sei que a minha amiga não se sente feliz na solidão em que vive, mas também é notório que cada vez se torna mais difícil ela sentir que tem necessidade de aceitar a ajuda que todos nós lhe queremos prestar.
Queremos ajudar, mas não sabemos como…

quinta-feira, 10 de julho de 2008

JARDINS SECRETOS

“Os jardins são usados como metáfora para representar o nosso mundo interior, onde guardamos tudo o que temos de mais valioso. Se estes “jardins secretos” não se transformarem num abrigo permanente, que exclui a confiança e nos afasta dos outros, pode também ser um espaço de liberdade e de desenvolvimento individual”
Cláudia Freitas
Revista Xis do jornal PÚBLICO

Todos nós, quando fomos crianças, desejámos ter um espaço só nosso, onde nos refugiávamos quando fazíamos alguma diabrura ou quando queríamos estar mais à vontade nas nossas brincadeiras. Alguns anos depois, o nosso quarto foi o lugar escolhido para nos isolarmos. Fechados à chave, quando ela existia… líamos algum livro que tirávamos ás escondidas da estante da sala e cuja leitura nos era proibida por não ser apropriada à nossa idade. Ali também chorámos as nossas primeiras desilusões amorosas e , olhando-nos ao espelho, procurávamos descobrir o motivo porque tínhamos sido rejeitadas. Algumas de nós confiavam as suas alegrias e tristezas ao pequeno diário que guardávamos longe dos olhares indiscretos. Lembro-me muito bem que o canto esquerdo da varanda da nossa sala, que dava para as traseiras, era o meu refúgio quando alguma coisa me assustava. Como não tínhamos jardim ou sótão, o meu quarto era o meu espaço, onde me recolhia e passava muito do meu tempo livre.
Quando adultos, temos momentos em que precisamos também dum refúgio para fugirmos aos problemas da vida, às frustrações, ao stress, às informações televisivas que nos mostram como o nosso mundo vai mal e à rotina do nosso dia-a-dia. E procuramos a mesa do café, um passeio à beira-mar , o sofá da sala, para, nós mesmos, nos recolhermos nos nossos “jardins secretos”, onde a lembrança de pequenas coisas, que guardamos dentro de nós, nos permitam que uma parte de nós fique no passado e continuemos a sonhar, mas que ao mesmo tempo, não percamos a realidade e consigamos sair do nosso alheamento e ganhar forças para enfrentarmos os desafios da vida.

segunda-feira, 7 de julho de 2008

UMA VISITA ...

Na semana passada fui visitar uma senhora amiga quer está num lar para idosos. Confesso que entrar nestas casas me deprime, venho de lá sempre triste e perturbada. Apesar de já ter ido várias vezes e também ter visitado outros lares, sinto-me como se fosse a primeira vez e isto talvez por estar à espera que alguma coisa tenha mudado e que eu possa sentir-me mais animada. Não me refiro à expectativa de encontrar novos móveis, um televisor maior ou as funcionárias com outro uniforme, por exemplo. Refiro-me ao que vejo reflectido no rosto dos idosos.
Quando entro nas salas de estar o que eu vejo são idosos normalmente sentados nos sofás, silenciosos, inactivos, com expressões tristes, alguns de olhos fechados, outros olhando quem entra, esperando a visita de um familiar ou amigo, e outros completamente alheios, aguardando, talvez, com ansiedade, o momento de recolherem aos seus quartos.
Quartos individuais, penso que serão poucos nestas casas. As despesas de manutenção são elevadas e as comparticipações dos utentes reduzidas. Quartos com duas ou três camas é uma das soluções para ajudar a equilibrar os orçamentos. Nos lares lucrativos, à custa de quantias elevadas, o idoso poderá ter o seu quarto com casa de banho privativa e até, em alguns lares, uma sala de estar anexa. Por vezes é-lhes permitido levar alguns móveis e assim viverem das suas recordações. Mas poucos, infelizmente, terão acesso a estes privilégios.
Surgiu-me agora uma ideia enquanto escrevia. Os idosos, quando entram para os lares, têm de aprender a viver no seu dia-a-dia com pessoas que, certamente, na sua maioria, lhes são desconhecidas. Alguns até poderão ser pouco comunicativos, que não apreciam estar em grupo. Outros podem gostar de conviver, são faladores, amigos da brincadeira. Encontrarão eles ambiente, espaço, para a sua boa disposição ?!
Certamente que outras questões bastante importantes eu poderia considerar, mas esta situação talvez seja um dos “porquês” do estado de espírito que eu vejo transparecer no rosto desses idosos que visito.
Enquanto novos, estamos abertos à novidade, a mudar de casa, a criar novos círculos de amizades, etc., mas, com a idade a avançar, tornam-se difíceis as mudanças e no mundo que criámos é nesse que gostamos de viver.

sexta-feira, 4 de julho de 2008

ONDE ESTÃO AS FAIXAS BRANCAS DA PASSADEIRA ?

Anteontem à tarde caminhava eu pelo passeio que contorna o canteiro fronteiro ao Cais da Alfândega quando vi que, em sentido contrário, vinha um homem novo, invisual, conduzido por um cão-guia, um Lavrador preto. Voltei-me e fiquei parada a ver, com admiração, como o animal iria conduzir o seu dono no atravessar da rua. Passado o canteiro, seguiram em frente, mas, depois, o cão parou por uns segundos, ficou indeciso, retrocedeu, aproximou-se da passadeira que existe em frente à Farmácia Faria, parou de novo, olhou para o chão e, hesitante, começou a atravessar a passadeira, mas mais no sentido da diagonal, e foi sair junto da parte mais elevada do passeio, o que levou o invisual a embater na borda do passeio. Depois, lá retomaram de novo a caminhada.
Torna-se difícil eu poder descrever com todos os pormenores o que observei. Por isso, peço a quem possa vir a ler estas linhas que tente visualizar esta situação. Certamente que chegará à mesma conclusão que eu cheguei. Aquela passadeira, como a maioria das existentes na nossa cidade, tem as faixas acinzentadas e a tinta branca, que as devia cobrir, já há muito que desapareceu. O animal ficou confuso porque foi treinado para atravessar nas passadeiras com faixas brancas. Só isto ! As nossas crianças também são ensinadas para só atravessarem as ruas nas passadeiras (com faixas brancas !). E as pessoas mais distraídas, aquelas com menos visão, e também os automobilistas, sobretudo quando conduzem à noite, poderão distinguir estas passadeiras ?!
Lembro-me que no passado, quando se aproximava a época balnear, víamos os pintores procederem à pintura das passadeiras e era agradável distinguirmos, já de longe, as riscas brancas a realçarem no escuro do asfalto.
Sabemos que a Câmara luta com dificuldades financeiras, mas será que umas latas de tinta irão sobrecarregar tanto as finanças da autarquia ?!
O que eu verifiquei foi a dificuldade de um cão, guia de um invisual, não estar à vontade para distinguir se estava ou não no caminho certo e não ter conseguido, da melhor maneira, conduzir o seu dono a chegar ao outro passeio. Não me venham dizer que a culpa foi do cão, que, talvez, ainda não esteja bem treinado para a sua tarefa. Eu não aceito essa desculpa.
O branco ressalta à vista do animal e não só. O cinzento é uma cor morta, confunde-se com o escuro do alcatrão ou dos paralelepípedos.
Fiquei muito chocada com a cena a que assisti, triste e revoltada e, por isso, fui logo ao Gabinete do Utente, na Câmara Municipal, escrever a minha “reclamação”.

quarta-feira, 2 de julho de 2008

UM SERVIÇO A CUMPRIR

Desde há já alguns anos que eu faço voluntariado junto de pessoas que, na sua maioria, sofrem de doenças cancerígenas e fazem regularmente tratamento no hospital da nossa cidade.
Todas as segundas-feiras ali me desloco para ter uns minutos de conversa com estes doentes durante uma hora e meia a duas horas. Os meus familiares e amigos, conhecendo-me bem e sabendo que sou uma pessoa um pouco introvertida, admiram-se que eu esteja ligada a este tipo de voluntariado e, de início, sentiram-se até receosos que me afectasse emocionalmente.
Depois de vestir a minha bata amarela passo pela capela do hospital e ali me recolho durante breves momentos numa prece a Deus, pedindo que Ele ponha nos meus lábios as palavras que aqueles a quem me vou dirigir precisam de escutar. É uma tarefa que nem sempre é fácil, depende muito do estado de ânimo dessas pessoas e também da minha própria receptividade e do meu estado de espírito. Às vezes, quando do nosso primeiro encontro, sinto-me receosa, sem saber como vou ser recebida. “Será que vou incomodar” ? Digo sempre a mesma frase nessas ocasiões quando me aproximo : “Penso que é a primeira vez que nos encontramos … !” Depois as palavras começam a fluir com naturalidade. Um ponto muito importante, que quero salientar, é que eu estou ali, sobretudo, para escutar, ouvir. E muitas dessas pessoas têm tanto para dizer ! Falam da sua família, da sua experiência de vida, alguns deles, como emigrantes que foram, o que fazem no seu dia-a-dia, o que semeiam nos seus quintais e tantas outras coisas. E eu vou estando atenta, limitando-me a dizer alguma coisa quando se proporciona, e vou ouvindo, ouvindo … e aprendendo que com o sofrimento a vida passa a ter um significado diferente. As vivências do passado ajudam muito a aceitar o presente e a ganhar forças para viver as incertezas do amanhã.
Só quero dizer que, quando, por qualquer motivo, sou obrigada a faltar a estes encontros das segundas-feiras, sinto-me em dívida para com aquelas pessoas, algumas das quais, eu sei, porque me dizem, deram pela minha ausência. Fico muito feliz quando ouço essas palavras porque elas dão sentido ao meu serviço.

segunda-feira, 30 de junho de 2008

O Vestido Branco

Na pequena vila onde vivia a família Rodrigues, Matilde, filha única do casal, era estimada por todos. O seu sorriso contagiante cativava até o Sr. Augusto, o dono da mercearia, homem de feições endurecidas onde raramente transparecia uma emoção.
Na escola, Matilde era conhecida pela sua inteligência. Tinha a tabuada na ponta da língua, sabia o nome de todos os reis de Portugal e os seus cognomes, os rios e os sistemas montanhosos e não havia verbo que não soubesse conjugar.
Fez a quarta classe e a admissão ao liceu com distinção. D. Rosa, a professora, não poupava elogios à sua aluna e aconselhou os pais a deixarem-na ir para o liceu, na cidade. “É uma pena se esta menina não continua os estudos. Com a sua inteligência até poderá vir a ser doutora, médica, quem sabe ?” …
O Sr. Américo, pai da Matilde, era operário numa fábrica de têxteis e a mãe, D. Fernanda, cuidava da casa e dum pequeno quintal que tinham nas traseiras. Conseguiam até arrecadar alguns escudos no final do mês, mas eles dariam para pôr a filha a estudar ? E depois, o liceu ficava ainda longe, a meia hora de caminho na camioneta da carreira. Sairia às oito horas da manhã e só regressaria lá pelas tantas da tarde. Eram muitas horas fora de casa, longe do olhar atento dos pais … Mil e uma preocupações vinham às suas cabeças. Mas, depois de muito pensarem e pedirem conselho aos familiares e amigos, no início do ano lectivo a Matilde foi continuar os estudos na cidade.
Os anos iam passando, a Matilde revelou-se sempre uma boa aluna, ao mesmo tempo que se ia tornando numa atraente jovem. Apesar dos conhecimentos que foi ganhando continuava a ser a menina de quem todos gostavam. Com 17 anos ela estava a acabar o sétimo ano do liceu. Preparava-se uma grande festa para os finalistas : um baile animado com um conjunto musical muito em voga na altura. As alunas andavam todas num alvoroço e a escolha da “toilette” era a conversa de todos os dias. “Vou levar ao baile um vestido comprido, de tafetá verde” dizia uma das alunas. “A minha mãe já comprou “organdi” cor-de-rosa. A costureira mostrou-me um modelo numa revista, que me fascinou” dizia a filha dum médico.
Matilde também sonhava. Quem não tem sonho aos dezassete anos ?! Imaginava-se a dançar a valsa com um vestido branco até aos pés, a saia em godés e umas alcinhas a segurarem o corpo ajustado. Fechava os olhos e sentia-se levada pelo seu par, deslizando e rodopiando à volta da sala.
Uma noite, encheu-se de coragem e falou aos pais do baile do liceu e do seu vestido branco. Eles trocaram um olhar entre si, baixaram a cabeça como que envergonhados, e o Sr. Américo, dobrando jornal que estava a ler, disse : “Ó minha querida filha, como nós gostaríamos que tivesses o teu vestido branco para ires à festa do liceu, mas as despesas com os teus estudos foram muitas e as nossas economias acabaram. Não podemos ajudar a concretizar o teu sonho, infelizmente. Nós sabemos que tu compreendes a nossa situação”. “Podes levar o vestido azul que a tua madrinha te ofereceu quando fizeste 17 anos … Não é branco nem comprido, mas ficas muito linda com ele. Vais brilhar ao pé das tuas colegas, verás !” disse a mãe.
Sim, ela tinha o vestido azul. Era um vestido de manga curta, franzido na cintura, que lhe descia até aos joelhos. Era muito bonito e até as suas amigas da vila lho tinham gabado. Mas não era o vestido branco com que sempre sonhara dançar a valsa …
Foi à festa, levou o vestido azul, dançou e encantou. Mas os seus pais, quando ela regressou a casa, não viram o sorriso nos seus lábios. Sentiram-se tristes, como tristes se tinham sentido por não lhe terem podido concretizar o seu sonho. Mas, em jeito de consolação pensaram : “Sonhos de rapariga … com o tempo vão-se desvanecendo … “
Matilde acabou os estudos e voltou para a vila. Começou por dar explicações a uns primos e pouco depois outras crianças se juntaram. Não foi para a universidade porque os parcos recursos dos pais não lho permitiram. Não foi doutora nem médica, como a professora Rosa havia imaginado, mas tinha à sua volta um grupo de crianças que precisavam da sua ajuda nas tarefas escolares. Sentia-se feliz e realizada. Amava a sua terra natal e ali queria permanecer. Ali estavam as suas raízes, a sua família, os seus amigos.
Aos 23 anos casou com o Carlos, seu amigo desde os bancos da escola. Também ele queria continuar a viver na vila e por isso licenciou-se em Farmácia e ficou a ajudar o pai, o farmacêutico da terra.
Formavam um casal feliz e respeitado por todos. Eram filhos da terra e a população sentia-se feliz por eles continuarem no seu meio.
Algum tempo depois foram abençoados com o nascimento de dois filhos : Diogo e Mariana, três anos mais nova.
Os anos passaram e também os filhos saíram da vila para continuar os estudos. Do liceu passaram para a faculdade. Diogo seguiu a profissão do pai e voltou para trabalhar na farmácia. Mariana foi a médica que talvez a mãe gostasse de ter sido. Ficou colocada no hospital duma cidade do interior. De tempos a tempos visitava a família.
Matilde sempre gostou de dançar, mas poucas vezes foi a bailes. As danças da vida foram-lhe roubando as oportunidades. Os anos foram correndo e agora, com mais tempo disponível, senta-se em frente ao televisor quando há programas de dança. Fica encantada a ver estes espectáculos ! Não é apreciadora daquelas danças muito mexidas, mas admira as coreografias. Para ela, a valsa e o tango são as suas danças preferidas. Não teve o “vestido branco comprido” com que tanto sonhou na sua juventude. Nas suas conversas e quando isso vem a propósito, lembra o seu sonho de menina, em jeito de brincadeira, mas quem estiver atento notará uma certa nostalgia, como se alguma coisa lhe tivesse sido roubada na juventude.
De criança se passa a jovem e dali é ver os anos correrem, os cabelos a embranquecer e a pele a enrugar. A idade vai avançando, mas os sonhos continuam gravados na memória, tal como o do “vestido branco” de Matilde. Sonhos que, quando somos novos, nos tiram o sono, nos deixam de olhar perdido no espaço, esquecidos de nós e do que nos rodeia. Passamos da alegria à tristeza sem qualquer explicação. Há alterações constantes do nosso estado de espírito que são tantas vezes incompreendidas pelos mais velhos.
Com o passar dos anos muitos dos nossos sonhos acabam por se irem perdendo no tempo, mas outros permanecem, como lembranças bem vivas do passado. Matilde envelheceu, mas continua a sonhar. A vida é feita de sonhos e aqueles que não abrem a porta à memória ficam parados no tempo. Os dias vão-se sucedendo numa rotina doentia, porque o amanhã será sempre igual ao dia que já passou.
“Continua a sonhar, Matilde”, porque “o sonho comanda a vida !”
Início de uma "carreira literária". Ah, ah, ah...!